segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Comida II


copo lá
copular
corpos nus
copulação
nação
corpo lá
copular
pular a cerca
alcançar o nexo
do sexo. 

Para este dia


Encontrei teus pés calçados em havaianas brancas

Encontrei-os porque eu buscava a poesia nesta manhã

Meus olhos se encantaram com os teus pés

Esbarraram-se neles porque tu estavas sentada movimentando-os

Não me exibiste os pés eu os vi e escutei os dizeres cantantes

Que saltaram dos teus calcanhares querendo dançar

No varal que eu estiquei para o poema deste dia. (05\12\22)

Joia

 Teu umbigo é uma joia

Vejo-o tão exposto

Nem pensas em ocultá-lo

Sinto vontade de escondê-lo sob a palma da mão

Tu desdenhas dos meus cuidados

E te vais sorrindo. (16\12\22)

 

Um barulho pro silêncio

 Viviane onde está?


Tu não existias para mim

Anunciaram-me teu desaparecimento

Agora tu és existência em mim

Não esqueço de ti

Tento encontrá-la nas notícias

E quando dizem que tu vives

Não sei se vives ou se morres entre os mortais. (19\12\22)

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Ponderando significações

 



Coco

Cuca

Cabeça

Tudo no coco

Tudo na cuca

Tudo na cabeça

O verbete

O fonema

A língua e a linguagem

Na cuca

Na cabeça

No coco

A poesia

As linhas da canção

A metáfora

O balançar dos desejos

Na cuca

No coco

Na cabeça

Tudo isso e muito mais

No coco

Na cuca

Na cabeça. 

 

 

 

 

 

Colheita

 

Um dia

Uma linha

Um sorriso

Um poema

Uma alma leve no ar

Versos na boca do poeta

Retirados de um dia

De farta escrita. 

 

Encontro sabático

 

Para o poeta Ferreira Lima

Dois poetas

Primeiro encontro

O dia é sábado

Manhã de outubro

O tempo não para entre nós

Vai e vem insinuando a pressa dos destinos dos mortais

Guardando nos ouvidos nossas falas

Tomara que elas caiam na voz dos ventos.

Trova

 

Minha nossa senhora, não é bolsonarista

Sigo com minha afirmação

Ela também não é petista

É mãe de quem a quiser e desta nação.

sábado, 8 de outubro de 2022

Sob a minha cruz



Muito cedo eu percebi que era frágil
Vociferei essa descoberta entre os mortais
Negaram-me os ouvidos
Deitaram sobre mim suas indiferenças
Fiz o meu caminho sob a minha cruz
Certo do meu fim e da conclusão do meu calvário
Sob o céu
Sob o sol
Que não clareia minha sombra.  

Sina



Não sou um deus sou apenas um poeta
Se subo o monte nenhuma musa espera por mim
Subo o monte e sofro porque o pão não é partilhado
Uns com muito e muitos sem nada
A liberdade por um triz
O medo domando jovens e velhos
Como não sofrer nesse contexto?
Não sou um deus sou apenas um bicho do mato
Que um dia se descobriu poeta por sofrer demais
As dores do mundo doem em mim
Escrever é o meu jeito de fazer justiça
Falar versos aos ventos
Deixá-los escritos é minha sina
Completa minha existência de mortal. 

Dose poética de fim de mês



copo vazio
cheio de ar
transborda?
copo vazio
transparente
sobre a mesa
do meu bar dileto
copo vazio
cabe nele as minhas ilusões?
o garçom vem a mim
deita o olhar no copo.
leva-o na bandeja
como se fosse a cabeça do profeta.

Dias finitos



a morte sempre me diz algo que eu tinha esquecido
a morte me surpreende e me derruba do décimo terceiro andar
a morte me diz que o que existia não existe mais
a morte umedece os meus olhos e as lágrimas escorrem
no meu rosto envelhecido
a morte faz com que eu colecione memórias
a morte tão cotidiana na rotina dos meus dias finitos
um dia fará silêncio em mim.

sábado, 3 de setembro de 2022

Até o fim da viagem



ela é negra como a noite

vi-a ontem

o ônibus em movimento

nossos corpos em repouso

vi-a ao meu lado

li seu rosto

li tanto sofrimento

vi seus olhos molhados

ou eram os meus?

olhei-a sem ter uma palavra para ela

num silêncio dolorido.

Sempre



sobre duas rodas
eu vou
eu me levo
eu regresso
sobre duas rodas
sob o sol matinal
conduzo meu corpo
conduzo minha bike
na longa estrada
sobre duas rodas
veículos apressados passam por mim
minha vida sempre por um triz
exposta ao tempo que passa.
exposta a morte sempre de plantão. 

De qualquer ponto



sobral e seus prédios
sob o céu
sob o sol
que sobra
sobral e seus prédios
que não arranham o céu da extensa urbe
sobral
sob o céu
sob o sol
de qualquer ponto
de vista. 

domingo, 14 de agosto de 2022

Memória paternal



já fui teu herói
afirmaste-me numa mensagem de whatsapp
devo ter sido também o teu bandido
porque uma moeda sempre tem dois lados
cara ou coroa?
na palma da mão a resposta
na cena a ação
no ponto de vista
uma certeza?

Aparição



Ela vinha sorrindo trazendo estampas nas coxas
Seu sorriso não se destinava a mim
Nem as estampas das suas coxas
Belas estampas que não se exibiam
Eu apenas vi e pensei em poesia
Enquanto te olhava
Enquanto tu passavas por mim. 

Pássaro de tróia



sou vento venho de Tróia
inquietei palavras na serra da Meruoca
fiz-me pássaro e poeta na cidade de Sobral
engendrei filhos com o barro que eu tinha nas mãos
sou pai as vezes mãe
uns me leem outros afastam os olhos dos meus escritos
Para uns sou poeta outros concluem que sou uma farsa
me apontam o dedo e me destinam ofensas
vou-me pela cidade sendo o que eu sou
saudoso de Tróia seu vento me acompanha
no pássaro que eu ainda sou.

Lua de agosto


Lua cheia de agosto
Bolacha fogosa sobre a cidade
Bolacha fogosa da minha infância
Nas alturas sobre nós
Não sacia a fome dos homens
Mas enche os meus olhos de encantos.

sexta-feira, 1 de julho de 2022

Mãe nada gentil

a pátria amada é fascista
o ódio se avoluma sob o céu
e o amor é trucidado em cada esquina
há sangue no poema e em todo o país
há sangue nas tuas lágrimas e nas gotas de sereno
que amanheceu no teu rosto
há sangue alagando o solo deste povo
filhos de uma mãe nada gentil.

Encontro matinal

No meio do caminho tinha uma cobra e um celular quebrado
No meio do caminho tinha um grito calado
No meio do caminho tinha um olhar que deixou de seguir as distâncias
No meio do caminho tinha andanças exaustas
Deixei-as para trás
No meio do caminho o vento brinca e joga areia
Nos olhos do tempo que tece sua passagem
No meio do caminho o poeta reitera versos
Encontra-se com textos para a poesia continuar sua jornada. 

Sono (in)desejável



durmo
acordo
é um novo dia
novas situações ou situações que envelhecem comigo
durmo
acordo
é um novo ano
novas esperanças
estou mais velho
durmo
acordo
meus filhos foram embora
já são homens feitos
passo os meus dias só com Eva
carecendo do paraíso que não lhe posso dar
durmo
acordo
será que acordei ou a rotina continua por se mesma?
durmo
acordo
finda um dia
o cansaço de longos anos rende-se à falência
e o sono eterno se apossa de nós.

Das tuas alturas

Tremo diante de ti tal qual vara verde
Porque és meu Deus
Porque ainda sou pecador
Porque ainda lhe tenho temor
Tremo diante de ti meu Deus
Porque não tenho as mãos limpas
Nem o coração puro
Todo dia fico sob o vosso olhar
Todo dia é o último para mim
É por isso que me vês tremendo
Das tuas alturas onde tudo é eterno.

sexta-feira, 10 de junho de 2022

No meu coco

o meu coco fica odara
ouvindo o coco do Caetano
no meu coco as vezes tem um mar
as vezes tem apenas sal
lágrimas de Sobral
no meu coco tem poesia
que transita do lado direito para o esquerdo
a inspiração vai e vem
como se fosse o vento
no meu coco tem outros dentro
às vezes há só um saco vazio de vento
com fonemas pulando dentro
no meu coco há dores e delícias
coragem de cangaceiro e fé de um santo
no meu coco não há água de um coco verde
fico odara quando a encontro abundante
no meu bar dileto.




Queixa junina

amei muitas musas
até fiz queixas por mais afetos
o tempo passou
e musa de poeta é página virada
ficou no passado
vago no monte parnaso
por lá só o vento e a solidão se avolumam
e a memória dos vates que me antecederam.

Entre os mortais



vi o sol matinal
meu olhar ficou cheio de luz
luzes coloridas
impedindo-me de ver as distâncias
veio a chuva
foi-se a chuva
ficou o frio
meu nariz entupiu
respiro pela boca
ainda é junho entre os mortais.

Como se fosse

é como se fosse uma guerra

todo dia devorar um leão

e amarrar outro pro dia seguinte

é como se fosse uma guerra

o pão de cada dia

a labuta em falta

falta tudo até afetos

é como se fosse uma guerra

a solidão em todos os lugares

o capital no punho de poucos

e as ruas acolhendo perdedores

é como se fosse uma guerra

não vencemos nunca.


O verso que se repete é de Paulo Leminski

quarta-feira, 4 de maio de 2022

Na memória



na moldura relógios derretem-se
sob o sol
ou sob as nuvens?
leio-os enquanto se derretem
afago-os na pintura
vejo-me findando
sob o sol
sob o céu.

Acontecimento matinal



andando pela casa ouvi um estalo
busquei aquele som com os olhos
vi uma barata em linha reta que se desenhou no piso
sem intencionar interrompi a jornada do inseto. 

Das linhas de James Joyce



frágil rosa branca e frágil
a mão que a estende
a vi branca como a rosa
a vi com veias rosadas
palmas delicadas
li suas linhas na ventania
entre nós tudo se vestiu de enigmas
e o silêncio se apossou de mim
enquanto meu olhar se deleitava no teu sorriso.
Os dois versos iniciais são de James Joyce

Nascedouro I



Eu tenho um poema na garganta
Que não se faz fala
Eu tenho um poema no desejo
Que não se realiza
Eu tenho um poema no silêncio
Que se nega ao barulho
Eu tenho um poema no olhar
Que não se deita no papel
Eu tenho um poema no fim do abismo
Quem irá lá buscá-lo?
Eu tenho um poema sujo
Que teme fazer alardes
Eu tenho um poema em gestação
Na minha solidão ele se encorpa
Eu tenho um poema que não chegará
No tempo previsto
Eu tenho um poema no bolso do jeans
Bolso raso
Poema profundo?
Finda o dia e eu tenho um poema
Que de mim não sai.

sábado, 9 de abril de 2022

Quaresmal



Piedade li escrito na parede
O sangue escorria sobre as palavras
Que diziam compaixão
Não havia corpo no pé do muro
Apenas dois rastros correndo
Ouvi-os gritando:
- Vai embora!
Não deixei nem o tempo passar
E fui-me. (10/03/20)

Inominável


depois desse gesto
depois desse silêncio
depois disso
depois daquilo
tu me vens enfeitado de índio
não te olhas no espelho da coerência?
fincaste cruzes sobre cadáveres
assassinaste a fauna e a flora
choro quando contemplo a Amazônia
a miséria que plantaste neste país não te comove?
pedidos de impeachment se avolumam
o desejo de vê-o longe dos poderes se agiganta
mas tu vens e vais como se nada tivesse feito
mas tu vens e vais como um fantasma
és tortura
és tirania
e amanhã será um novo dia
que seja sem a tua presença
que a utopia e o sonho possua a todos nós.

Para Ela


Nossa senhora é minha

e eu sou dela

por isso só penso nela 

de manhã e até depois da tardinha


Nossa senhora na gruta

quando vou lá ela me escuta

a gruta lá do boqueirão

fico perto da santa ao findar o estradão.


Volto pra casa cantando

pedalando minha bicicleta

com uma nova fé brotando

na minha alma de poeta. 

Oh rio Acaraú!!



Águas novas
Águas velhas
Novos cheiros
Velhos cheiros
Esgotos da cidade
Nessas águas
Nesses cheiros
Do Rio Acaraú
Esse convívio antigo
Vai chegar ao mar?
Essas águas
Esses esgotos
A cidade
E esse convívio antigo
Dormem e acordam
No teu leito
Oh Rio Acaraú!

sábado, 12 de março de 2022

Discurso da lembrança

Recordo teus dedos correndo nos meus cabelos brancos
Recordo teu corpo se inclinando sobre mim
Recordo tua boca com aquele batom
Recordo o beijo que não nos demos
Recordo o tempo passando entre nós
Recordo teus abraços matinais
Recordo teus cabelos ao vento
Recordo nossas mãos tão próximas
Recordo nossos olhares
Recordo minha fala nos teus ouvidos
Recordo os fonemas do teu sorriso
Tecendo a linguagem dos nossos dias
Recordo que o fim de tudo nos alcançou
Deixando-me distâncias e memórias tuas.

Quaresmal

Piedade li escrito na parede
O sangue escorria sobre as palavras
Que diziam compaixão
Não havia corpo no pé do muro
Apenas dois rastros correndo
Ouvi-os gritando:
- Vai embora!
Não deixei nem o tempo passar
E fui-me. (10/03/20)

Ilusão de sexta-feira

Era uma mosca azul, asas de ouro e granada
Voava sobre mim
Insistia em rondar meus ferimentos
Eu insistia em expulsá-la
Entre mim e ela se estabeleceu uma luta
Quase sem fim
foi-se o dia
Veio a noite
E lá estava ela tentando vencer-me
Ficamos exaustos
Ela pousou na minha mão
Enquanto se deslizava nas linhas das minhas palmas
Lia meu destino de mortal.

O primeiro verso é de Machado de Assis 

sábado, 12 de fevereiro de 2022

Voz do reino



estou no trono
trono de merda
trono de louça?
louça da Celite?
trono cinza de merda
merda cotidiana
afirmo
dou fé. 

poema da continuidade



faz escuro mas eu canto
um canto de resistência
tu dormes no ventre da terra
mas as tuas vestes brancas nos iluminam
fazendo-se sol da América Latina
faz escuro mas eu canto
mesmo em tempo de trevas
e a tua poesia se ergue diante de nós
orientando a nossa voz no ar
que o vento leva para onde deseja
faz escuro mas eu canto
para seguirmos de mãos dadas
fazendo valer só a verdade.

O verso que se repete é de Thiago de Mello 

Aos nossos olhos



que não fique comum esse gesto
que não seja natural esse acontecimento
que tudo seja estranho
nos espante
que tenhamos voz para criminalizar
que sejamos a justiça que falta
para que nada seja banal
aos nossos olhos.

Destino



amar
desamar
lembrar
esquecer
enquanto vivo
enquanto sofro
enquanto busco
enquanto encontro
enquanto finco os pés
na terra prometida. 

Nesse poema



vi seu olhar
seu olhar viu-me?
levou-me como lembrança?
vi seu olhar
olhos grandes e verdes
vi seu olhar
e nem pensei em nada
mas agora nesse poema
recordo-o nos meus versos. 

sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Revolto



os homens amam e comem o pão
que Deus ou o Diabo amassou
os homens vivem e morrem
em cima da terra
debaixo do céu
os homens contemplam o infinito
erguem as mãos
o tempo ágil e impaciente curva-os
fazendo-os dormir no ventre da terra
o céu límpido e passivo
fica olhar sombras e jazigos. 

Alusão à Drummond

 

não tenho armas
mas posso me revoltar
tenho mãos
farei os ventos moverem
os moinhos e a história...


círculo vicioso

 

até quando os meus olhos

terão que ver o êxito da tirania?

esta indagação morreu nos lábios

dos meus ancestrais

esta, agora ressuscita em mim

todos os meus dias

são feitos de angústia

o ontem dos meus antepassados

é o meu hoje.